Paula Teles em Artigo para a INCorporate Magazine
A necessidade de reforçar as políticas urbanas para criar espaços públicos adaptados à escala humana é urgente.
Os dados mais recentes dos censos revelam que, nas últimas décadas, a taxa de motorização continua a aumentar, contrariando as expectativas de investimentos em alternativas modais, especialmente na mudança de deslocações do automóvel para modos mais sustentáveis. Em Portugal, o uso do automóvel atinge uma média de 60%, chegando a 80% em algumas cidades, enquanto os modos de “andar a pé” e “usar transportes públicos” continuam a diminuir.
Os deslocamentos casa-trabalho-escola estão cada vez maiores e mais variados. Além disso, passamos mais tempo dentro do carro e caminhamos menos, o que não contribui para a sustentabilidade do planeta nem para a saúde.
Quando a escala urbana se afasta da escala humana, criamos cidades desumanizadas, sem espaços públicos acessíveis para a convivência urbana e sociabilidade. Isso afeta especialmente a mobilidade de idosos, pessoas com deficiência, mulheres com carrinhos de bebê e crianças. As crianças, em particular, são impedidas de serem livres, já não vão para a escola a pé e passam cada vez mais tempo isoladas em frente a telas, envolvidas pelo mundo das tecnologias.
Tonnucci Neto e outros cientistas estudaram o comportamento das crianças e descobriram que aquelas que brincaram ao ar livre na infância tiveram grande sucesso no futuro. Paradoxalmente, as crianças de hoje não brincam, não correm, não se sujam no chão das ruas, nem sobem em árvores.
Esses especialistas defendem que brincar no espaço público aumenta a capacidade motora, a autonomia, a autoestima e a sociabilização, características essenciais para formar adultos ativos e preparados para resolver problemas complexos. Atualmente, os reclusos têm duas horas por dia ao ar livre, enquanto nossas crianças têm, em média, apenas uma hora. O sedentarismo, a obesidade e o stress são problemas que já enfrentamos nessas idades.
Portanto, precisamos de políticas públicas determinadas para redesenhar as cidades, tornando-as mais funcionais, confortáveis, seguras e inclusivas. Precisamos de calçadas maiores, passadeiras que garantam continuidade, iluminação adequada e mais jardins para que as crianças possam voltar a caminhar e brincar. Só assim a vida retornará às cidades. O comércio de rua ganhará vida, os cafés terão frequentadores e as pessoas passarão a caminhar e conviver mais.
A Rede Cidades e Vilas que Caminham é um projeto ibérico, gerido em Portugal pelo Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade, que já conta com cerca de 40 municípios portugueses. Espero que esta rede de conhecimento e boas práticas, que tenho a honra de dirigir, consiga influenciar as autarquias a tomar decisões corajosas.
Que os cidadãos também se envolvam nesta luta, pois todos somos essenciais para concretizar o sonho de ter cidades mais humanizadas.
Artigo disponível em: https://incorporatemagazine.com/2024/03/29/apostar-nas-cidades-que-caminham/?fbclid=IwZXh0bgNhZW0CMTEAAR3qBpxW7gQ_NJmZSdxCi_Oq_iCDMacks9yvrE_loGDVMB69vtSbeasD01s_aem_1bN6YPWEaPFPEQedQbwgQw